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artigo

o gokai explicado

resumo

Os Gokai, ou os “Cinco Princípios do Reiki”, são de uma exigente compreensão. Através de um entendimento, não apenas teórico mas prático, proponho-me a proporcionar-lhe um encontro com o conhecimento e com a experiência dos Gokai e sua internalização. Finalmente proponho-lhe um exercício simples de integração dos ensinamentos dos Gokai na experiência do dia-a-dia. Rotinas e tempo são questões difíceis nos dias de hoje mas haverá sempre tempo para "convidar a felicidade" para as nossas vidas. Este artigo introduz cada secção dos Gokai, os seus significados como entendidos pelo seu autor, através do sistema Jikiden Reiki. Proponho a breve leitura dos Gokai pela lente de um Psicanalista Integrativo numa proposta de abordagem prática à filosofia do Reiki.

O Gokai Explicado - O que é e como usar.

(2018) Abr-Jun, Reiki & Yoga, ed. revista

Os Gokai, e as suas secções, podem ser discutidos em termos de significado, observando os cinco princípios e o seu enquadrante Kyo dake wa (Só por hoje), explorando o seu propósito de criação e o seu impacto vibracional.
 

Sobre o Kyo dake wa, melhor traduzido como apenas por hoje ou só por hoje, sinto na minha prática do Gokai que as palavras de Usui Sensei atingem essa nota: "Estou aqui, estou aqui (agora) e devo (agora) reconhecer isso”.

Reencontro essa verdade no sentido em que, quando nos trazemos "aqui/agora", o passado e o futuro tendem a desaparecer. Ficamos com menos limitações ou, por outras palavras, somos pelo menos deixados mais livres de limitações passadas de angústia e livres de ansiedade limitando as possibilidades futuras. Portanto, podemos libertar-nos, na maior extensão que nos for possível, através da vibração sonora e energética "Kyo dake wa".

 

Sinto que exemplos da vida quotidiana aproximam as pessoas dos ensinamentos de Usui Sensei. Ele mesmo o postulou como fica claro na leitura do seu epitáfio. Isso pode ser encontrado em "Reiki e Japão", obra de Masaki Nishina, um raio de clareza extraordinário sobre o Reiki Japonês, sobre o Reiki Estilo Ocidental e, adicionalmente, sobre a cultura japonesa.

 

Assim, poderíamos introduzir Kyo dake wa com uma cena em que estamos a cortar legumes com uma faca muito afiada. Pode estar a pensar noutras coisas, distraído, sem estar focado ou concentrado, sem consciência de si mesmo e do seu corpo. Mas será muito difícil não cortar os dedos em vez dos vegetais colocados sobre a tábua. Em contraste, pode preparar a tábua, a faca, lavar os vegetais, fazendo isso corretamente, só por hoje, aqui e agora. Como meditação activa. É preferível fazer as coisas na Vida estando presente no momento, conscientes de mente e corpo, abandonando limitações passadas e ansiedades futuras, do que enfrentar os riscos e as consequências na vida por não estar centrado, consciente e focado, como ter dedos cortados em vez dos vegetais.

 

Sobre Ikaruna, a orientação é não permanecer em raiva. Podemos associar zanga, ódio e raiva com pelo menos três eixos de interpretação: destruição, miséria e narcisismo. Enquanto pratico e ensino a vibração Ikaruna, sinto que a raiva é o fundo absoluto em termos de afetos e do seu potencial destrutivo. A raiva destrói e auto-destrói devido à sua raiz narcísica de auto-estigmatização ou da sua complementaridade doentia: a arrogância. A pessoa egocêntrica tem apenas um plano inconsciente: acabar só. Invariavelmente, mesmo que a pessoa cheia de raiva, egocêntrica, esteja rodeada de pessoas, ela estará afetivamente sozinha. Só no sentido em que a raiva não deixa espaço para amar os outros e muito menos a si própria. Para além disto, só também dado que os outros não a rodeiam por amor ou apreço, mas por medo, sentimento de insuficiência ou dependência. Ikaruna torna-se, através dos ensinamentos de Usui Sensei, o primeiro princípio orientador da filosofia do Reiki, materializado nos Gokai, provavelmente porque a raiva é uma das mais baixas frequências vibracionais e por isso se torna uma das causas principais de doença na mente e corpo. Consequentemente, Ikaruna significa evitar o egocentrismo e desenvolver, progressivamente, uma abertura para os outros e na direção dos outros. Também, a lógica relacional em Ikaruna orienta implicitamente para a empatia e a compaixão, no sentido de que não estar e permanecer zangado ou enraivecido implica também uma capacidade de distanciamento do “meu ponto de vista” e um caminho para o “outro”.
 

Shin pai suna desenvolve de imediato um elo mental através do seu significado. A ideia de mente, traduzida em Shin, torna-se o centro da ideia de descartar a preocupação. Um significado direto do segundo princípio do Reiki poderia ser descartar a energia de preocupação da mente. O significado implícito de tudo o que é "conteúdo de preocupação na mente" é a projeção do Eu no futuro. Em outras palavras, a preocupação é um ensaio mental para o fracasso. Nós, na verdade, quando fazemos o “exercício da preocupação”, criamos uma versão de nós próprios no futuro, no pior dos mundos possíveis, a maior parte das vezes fracassando da pior maneira possível. Assim, lembre-se de que, ao treinar a sua mente a preocupar-se estará, de facto, ensaiando mentalmente para o seu fracasso. Como todas as secções dos Gokai se referem ao Kyo dake wa, poderíamos dizer novamente, no contexto Shin pai suna, que o futuro ainda não existe. Desta forma, a preocupação dilui-se no seu significado quando removemos o futuro da conversa. Como me vou preocupar se aceitar que o futuro ainda não existe? Shin pai suna é uma nota mental para nos focarmos no presente, aqui e agora, e não nos projetarmos em algo que, não só não existe, mas também não é controlável. Estas duas características, não-existência e não-controlabilidade, formam o tecido para a ansiedade.

Kan sha shite pode efectivamente ser uma das secções de mais difícil entendimento no Gokai. Penso que este facto derivará da estreita relação de contrate entre gratidão e cultura capitalista. A aparente mensagem superficial para Kan sha shite é muito simples: seja grato. Hoje em dia todos ouvimos muita gente dizer "como são gratos por algo". Mas se formos um pouco mais fundo, logo sob a superfície, começaremos a encontrar pequenas diferenciações em sentimentos e vibrações como "ser grato", "sentir-se em dívida" e "sentir-se culpado" só para citar algumas. É aqui que penso que a cultura capitalista desempenha um papel fundamental na (des)organização da gratidão. Através da cultura ocidental aprendemos todos os dias que a vida é supostamente difícil e há coisas das quais devemos sentir medo. Em contraste, na filosofia do Reiki e na leitura de "The Essence of Shinto" de Motohisa Yamakage, fico impressionado com a descrição da atitude em relação à Vida e à Natureza. Esta é uma de liberdade, aberta e em essência natural. O contraste deste enquadramento mental com a crença de que as coisas devem ser difíceis empurra a cultura ocidental para longe da apreciação da Natureza como ela é e das suas bênçãos naturais. Em resumo, da gratidão na sua forma mais pura. Navegando em direção ao significado de Kan sha shite, apresentaria duas notas. Em primeiro lugar, a gratidão é um estado de espírito que se relaciona intimamente com a paz interior e com um sentido puro de liberdade para nos relacionar naturalmente com a natureza. Em segundo lugar, e é isso que torna a primeira parte tão difícil, deixar de lado uma cultura (ocidental capitalista individualista) indutora da competição e do medo que nos ensina precisamente o contrário: que todo o contacto com os outros ou com a própria natureza deve ser mediado ou, de algum modo, artificializada. Se, de facto, encontrarmos em nós mesmos a possibilidade de sermos gratos devemos preservar esse lugar dentro de nós dado que é um lugar de paz, amor e aceitação para com o mundo e a natureza tal como ela é.

 

Gyo o hageme é mais uma vibração vivida com alguma dificuldade na cultura ocidental. Existe a questão do "dever" em associação com dois conceitos aparentemente semelhantes, mas contrastantes: obrigação e responsabilidade. O Gyo, em Gyo o hageme, relaciona-se com o “dever”. Mas para compreendermos este princípio do Reiki, sinto que temos que diferenciar explicitamente entre um foco interno e um foco externo. É, talvez, um dos itens mais complexos de discussão teórica em psicologia e psicanálise: o problema da agência. Isto é, quem está no comando, quem está na sala das máquinas fazendo as coisas acontecerem. Somos comandados e orientados por uma força ou entidade externa? Ou fazemos as coisas por nossa própria decisão, intenção e vontade. Podemos realmente dizer que todas as vezes nos envolvemos num “dever” estamos envolvidos connosco próprios responsavelmente? Ou estamos apenas a ser arrastados por alguma obrigação implícita? O caminho vibracional de Gyo o hageme é apresentado sob a forma de uma maneira de aprender lições valiosas e de crescer através da vida quotidiana, do trabalho e, também, como um princípio que contém uma grande profundidade, condensando significado de trabalho em missão de vida. Assim, vemos que o "dever" em Gyo o hageme é um dossier que contém muitas folhas de escritos profundos. Alguns deles são muito claros e diretos e outros, de alguma forma, ilusórios ou invisíveis. Sinto que Gyo o hageme é uma ótima oportunidade para observarmos o conceito de responsabilidade e o foco interno que a cultura japonesa ancestral favorece, em vez da cultura ocidental, mais superficial, orientada pela obrigação e pela externalidade.

 

A última secção dos Gokai é uma lição sobre o Universo e o modo como ele flui e podemos fluir com ele. Hito ni shin se tsu ni aparece como uma oportunidade para oferecer bondade e gentileza. A qualidade e o tecido do Universo permitem que o indivíduo se torne um agente da bondade, mesmo que não seja valorizado imediatamente ou reconhecido por outros. Sinto que, quando Usui Sensei fala de bondade em Hito ni shin se tsu ni, é no sentido de capturar a atenção do indivíduo para o que de “bom tem para oferecer ao Universo e aos outros”. A bondade torna-se o farol para a essência do ser humano. Sinto realmente que Usui Sensei materializa na sua “bondade” a frequência da compaixão amorosa para com o outro. Ao abordar Hito ni shin se tsu ni, tento pintar a imagem do Universo como um sistema de energia que flui, onde o nosso único objetivo é o de aumentar a quantidade de energia, e sua frequência, que flui no sistema. Isto é, o Reiki é a energia natural que flui no e do corpo humano, por isso nós, como praticantes de Reiki, somos responsáveis por dar o máximo de Reiki possível. Isto é verdade independentemente se nos referimos a um tratamento de Reiki propriamente dito, à abordagem às relações com os outros ou mesmo a situações ou conversas internas connosco mesmos. Todos estes contextos beneficiam de nos perguntarmos como estamos na vibração Hito ni shin se tsu ni. É sempre possível encontrar uma maneira de sermos mais gentis com os outros e connosco próprios.


Anotamos agora como usar os Gokai na sua vida quotidiana. Uma coisa é ler os Gokai, em teoria, como explicado na literatura, através da grande variedade de artigos disponíveis em livros ou online, nos sistemas Jikiden ou de Reiki de Estilo Ocidental. Outra coisa é vivê-lo. Assumi-lo e aceitá-lo em nós. Trazer os Gokai para as nossas vidas, as nossas experiências, as nossas rotinas diárias, para finalmente o internalizar. Internalizar os Gokai não é dizer que sabemos o que é, ou dizer que há apenas uma verdade absoluta sobre o seu significado. Um Praticante de Reiki deverá saber que as secções do Gokai estão sempre em profunda conexão com o indivíduo e com sua experiência de vida. E, para além disso, que a enorme quantidade de oportunidades de crescimento na vida traz os ensinamentos do Gokai, condensados em pergaminho por Usui Sensei, à nossa consciência quase instantaneamente. Assim, o que compartilho aqui é o processo pelo qual eu próprio vou internalizando os ensinamentos dos Gokai, conforme os experimento e sinto. Em adição, tenho em mim os ensinamentos dos meus professores e mentores tendo descoberto que os Gokai crescem progressivamente dentro de mim, com mais e mais camadas de significado. Desde o tempo em que comecei a ouvi-los e a estar atento à sua vibração.

   O que quero então dizer com "internalizar" o Gokai? Em termos simples, poderíamos dizer que chegará um momento em que podemos (1) entoar o Gokai no japonês original, corretamente, (2) saber o que significa e (3) senti-los a transformar o nosso estado mental enquanto pensamos sobre sua vibração ou entoação. Será, então, fácil e simples. Em termos práticos, como proponho que se possa conseguir isto? Pode tratar cada secção dos Gokai como um instrumento para sua recuperação, física, psicológica, emocional, energética ou espiritual. Desta forma, use os Gokai como um instrumento para se transformar a si mesmo. Secção a secção, dia após dia. Seja resiliente, seja paciente. Assuma os ensinamentos como seus. Aproprie-se dos Gokai e aceite-os dentro de si.

 

Aqui deixo um exercício simples. Por exemplo, observemos Kyo dake wa. Como vimos acima, entendemos isto como um instrumento mental a tocar a nota: "Estou aqui, estou aqui (agora) e devo (agora) reconhecer isso". Então, de uma forma objectiva (1) eu pego a secção Kyo dake wa e (2) repito-a através do meu dia, por uma semana, duas semanas, um mês, até que eu a sinta a fluir através do corpo. Até que eu possa sentir que Kyo dake wa é um botão que liga um interruptor em mim e me coloca na frequência de "estou aqui e agora". Lembro-me que existo "no momento presente" e que nesse preciso momento, o passado e o futuro, são apenas criações mentais longínquas.

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